Parir um segundo disco. Em poucos meses gravar novas músicas. Ao contrário de algumas bandas que há muito já tinham um repertório vasto e dispunham de material ainda para lançar mais um ou dois trabalhos sem esforço, tivemos que começar a compor pensando no novo LP. O que era prazer, agora era obrigação. No entanto, não arredávamos o pé de gravar aquilo que nos agradasse acima de tudo. No início do ano de 87, tínhamos três músicas prontas (“Catedral”, “1/4”, “Ida e Volta”), três inacabadas (“Duas”, “Limites”, “A Era da Incerteza”-que mudou de nome para “Dança Tonta”) e o resto totalmente embrionário.Desenvolvemos as outras músicas praticamente dentro do estúdio. Um disco que não contou com nenhum convidado, ao contrário do primeiro, por se tratar de um disco de auto afirmação. Afinal, a que tínhamos vindo? O título estampava a nossas dúvidas, nossas inseguranças. Um disco que vendeu bem , porém foi pouco conhecido. Mesmo assim, um xodó do Biquini, com certeza
Biquini Cavadão :
Alvaro Birita Lopes – bateria , violão
André Sheik Fernandes – baixos
Bruno Gouveia – vocal
Carlos Coelho – guitarras, violões
Dr. Miguel Flores da Cunha – piano, teclados, vocal
Ronaldo Cunha Lima Filho – percussão
Produzido por Carlos Beni
gravado por Julinho, Marcio Gama, LC Coutinho, Jairo Gualberto, Ari Carvalhaes
auxiliados por Antonio Barroso, Charles, Carlinhos Lionel
mixagem em digital: Jairo Gualberto, Marcio Gama, Charles, Ari Carvalhaes, Carlos Beni, Sheik e Bruno
montagem digital: Luigi e Américo
corte digital: José Antônio e Américo
fotos: Maurício Valladares
capa: Ricardo Leite
coordenação gráfica: Arthur Fróes
Gravado e mixado nos Estúdios Polygram, Rio de Janeiro, entre maio e agosto de 1987O Biquini na Estrada
empresário – Ronaldo Cunha Lima Filho
técnico de som – Daniel Telles
Roadies – Dudu e Paulinho Moleza
Agradecimentos: Augusto dos Anjos, Paulinho Lukather, John K. Galbraith, Marcelo Mansur, Jimmy Jam & Terry Lewis, Paulo André, Danny Bro, Paulo Henrique e Iuri, Sergio e Chambinho, P. Gabriel, e todos nos Estúdios Polygram, pela infinita paciência.Contatos para shows: Boom Produções Artísticas (Ronaldo)Correspondência: Fã Clube da Cadela Pornográfica
cx.postal 14744 cep 22412 Rio de Janeiro
Era da Incerteza
por Carlos Beni
Nós vivemos na era da incerteza, sempre suspeitando das surpresas que o amanhã trará. Não só incerteza econômica (a que se refere John K. Galbraith, o criador da expressão), mas incerteza absoluta e total. Estamos sitiados pela incoerência dos fatos. Incertos no amor, incertos na fé, incertos na política, na eterna dúvida se há um futuro.
A música inusitada e cheia de surpresas do Biquini Cavadão é um retrato desse tempo. Um ponto de interrogação na cabeça do ouvinte, é esse o efeito da música deste disco. 0 que é diferente às vezes assusta, mas muitas vezes agrada, especialmente numa época de música de fórmulas fáceis, engajamentos políticos forçados e slogans gastos, numa falta de imaginação generalizada.
0 Biquini Cavadão desafia qualquer definição simplista. A originalidade de sua música o desvincula de qualquer corrente. Isto certamente faz as coisas mais difíceis para eles, e para o Depto. de Marketing da Polygram. Afinal, como se define um grupo sério que se chama Biquini Cavadão?!? 0 que é rock’n’roll de menos para ser rock tradicional, funk demais para ser progressivo, erudito demais para ser funk, rock demais para ser MPB.
0 milagre do Biquini Cavadão é ter conseguido juntar influências tão disparatadas num som único. Se no LP de estréia essas influências pareciam comprometer um pouco a unidade do trabalho, em—A Era da Incerteza— elas se moldam, criando uma sonoridade nova e intriganle. 0 Biquini Cavadão é a própria antropofagia musical, que digerindo as suas influências as transforma numa música nova e brasileira.
No ano e meio que separa o lançamento de—A Era da Incerteza – do LP de estréia -Cidades em Torrente”, muita coisa aconteceu. Foi um ano cheio de sucessos e descobertas, um tempo de evolução e amadurecimento, pessoal e profissional. 0 que tinha sido uma inconseqüente brincadeira estudantil, virou uma profissão, uma obsessão, uma religião. 0 Biquini Cavadão é um sucesso, e islo mudou a vida de todos, de uma forma que os ex-estudantes nunca imaginaram.
De fato, o processo de profissionalização de uma banda é um momento crítico, que muitas vezes deixa marcas profundas. De repente, o que era diversão vira obrigação, o que só dava despesa passa a gerar lucro. o que era amizade passa a ser sociedade. Muitos grupos acabam nesta transformação, ou perdem a inocência amadoristica, e junto a inspiração real do trabalho. 0 que era arte passa a ser só um negócio,
Felizmente, esta etapa foi vencida pelo Biquini Cavadão de forma bastante tranqüila, sem traumas maiores ou disputas de poder. A visão artística que guia o trabalho do Biquini Cavadão continua a mesma. Provavelmente, o fato do grupo ser uma unidade verdadeiramente democrática, onde todos compõem, lodos fazem os arranjos, contribuiu para que ninguém tivesse ‘ego-trips’, ou ataques de estrelismos,
0 Biquini Cavadão foi uma das bandas nacionais que mais fez shows em 86/87. Isto gerou na banda uma confiança como ‘ “performers’, que faz de um show do Biquini Cavadão hoje, mais do que uma simples execução de músicas, um evento de ação, movimento e música.
A estrada também deu uma maior consistência ao Biquini como banda, com mais segurança e versatilidade como músicos, o grupo evoluiu muito como unidade musical. Esta competência instrumental está largamente documentada em -A Era da Incerteza-, Não que isto importe muito para eles, porque o Biquini Cavadão é um grupo que toca em função da canção, sem a menor pretensão virtuosística,
0 processo de amadurecimento do Biquini não se restringiu à música, também nas letras houve uma mudança significativa. Se no outro disco, elas podiam ser classificadas de adolescentes sem imbecilidade, neste novo disco os temas são bem adultos. Apesar do grupo manter sua tradição de tratar temas do dia-a-dia, a perspectiva já não é mais a da ingenuidade mas a de quem já provou o gosto da realidade.
A HISTÓRIA DO MUNDO PARTE II
A Era da Incerteza” começou a ser feito a partir de novembro de 86, quando recebemos da Polygram a incumbência de produzir um disco para ser lançado em março de 87? Há?, Há?, Ha?
A essa altura dos acontecimentos, o grupo de incansáveis preguiçosos, conhecido pela alcunha de Biquini Cavadão, tinha três músicas prontas: ‘Catedral’, ‘Ida e Volta’ e ‘1/4 ” .Nos internamos intermitentemente em Teresópolis para compor. Destas ‘brainstormings’, regadas a ‘chianti’, surgiram “Duas” e partes de “Limites” e “DançaTonta”, que foram completadas em mais ensaios no Rio.
“Assim, entramos no estúdio em final de maio, partindo para o processo favorito de composição do Biquini Cavadão, compor no estúdio, Alguém tem que explicar a estes rapazes, que esta não é a maneira mais econômica de se fazer discos. De qualquer forma. no estúdio foram compostas “Tormenta” e ‘Um Corpo sem Alma’.
Gravar um disco com o Biquini Cavadão é flertar com o desastre, as idéias mais absurdas são propostas a todo instante na maior seriedade. É necessário um grande auto-controle para não se partir para a ignorância.
Quero crer que tanta masturbação aural não foi em vão. Me parece que com ‘A Era da Incerteza”, o Biquini Cavadão se estabelece como uma das grandes forças renovadoras da música no Brasil,
Carlos Beni
Depto de Imprensa
fevereiro/1986
PolyGram